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Afroempreendedorismo: o que é e qual a sua importância no Brasil?

O afroempreendedorismo é o empreendedorismo idealizado e realizado por pessoas negras. Em novembro, comemora-se o Dia da Consciência Negra, e não é de hoje que pautamos por aqui a relevância de se celebrar datas afirmativas. Afinal, posicionar a sua marca em diversidade é necessário para inúmeras vertentes, como por exemplo, atração e retenção de talentos, interesse de investidores, ESG, e muito mais.
Mas, mais do que isso, datas como esta nos dão a oportunidade de furar a bolha do dia a dia e levantar questionamentos poderosos. Faça o teste do pescoço: olhe ao seu redor e conte quantas pessoas na sua empresa, nas startups em que você pretende investir ou até mesmo no seus círculos pessoais são pretas? É por isso que precisamos falar sobre afroempreendedorismo.
No momento, este segmento é majoritariamente formado por mulheres e tem como maior campo de atuação o comércio, especialmente com negócios voltados para a indústria de cuidados e de comunicação, de acordo com o apontado na "Pesquisa Afroempreendedorismo Brasil" da RD Station, realizada em parceria com o Movimento Black Money e Incentivos.
Esse mesmo levantamento também revelou que 40% das pessoas negras no Brasil são empreendedoras, percentual que representa 14 milhões de pessoas.
Um significativo ponto de destaque quanto a esses números vem do fato que praticamente todas as ideias de empreender surgiram de uma dor desse público. Essa dor, por sua vez, estava diretamente relacionada a questões e problemas raciais.
Mesmo assim, a maioria não atingiu o faturamento esperado. Segundo o mesmo estudo, das 701 respostas consideradas válidas, 48,6% afirmaram que ainda não tinham faturado, e 19,8% que faturaram entre R$ 6.001 e R$ 12 mil.
Mas quais seriam os desafios que levam um número tão grande de empreendedores(as) a não conseguir faturamento? Quais obstáculos seguem sendo necessários transpor para o afroempreendedorismo no Brasil ganhar o espaço merecido e, mais ainda - para que isso se reflita no ecossistema de tecnologia e startups?
Preconceito racial e desigualdade social certamente são alguns desses entraves. Siga a leitura deste artigo e confira os demais.
O que é afroempreendedorismo?
O afroempreendedorismo pode ser definido como o empreendedorismo idealizado e concretizado por pessoas negras.
Segundo uma pesquisa realizada pela PretaHub, hub de criatividade, inventividade e tendências pretas, em parceria com a JP Morgan e Plano CDE, e citada em uma matéria do Think with Google, as motivações que moldam o perfil dos afroempreendedores brasileiros são:
necessidade: homens e mulheres que precisam de renda e/ou estão desempregados, muito por conta do perfil socioeconômico do nosso país com uma cultura racista enraizada. A maioria atua informalmente, o que também acentua a falta de percepção de que são empreendedores;
vocação: com a maioria formalizada, esse grupo entende o afroempreendedorismo como uma forma de "trabalhar para si", e muitos têm outros exemplos na família;
engajamento: também com a maioria dos afroempreendedores formalizados, os homens e mulheres que compõem esse grupo valorizam a atuação em rede e enxergam suas atividades como ações autoafirmativas para o público negro.
Afroempreendedorismo no Brasil
A Pesquisa Afroempreendedorismo Brasil que citamos logo no início deste artigo traz outros dados interessantes sobre esse segmento no nosso país.
No que se refere ao gênero das pessoas afroempreendedoras:
61,5% se consideram mulheres cis (pessoas designadas como mulheres no nascimento e que se identificam como mulheres);
36,4% se consideram homens cis (pessoas designadas como homens no nascimento e que se identificam como homens);
1,4% se apresentaram como "outros";
0,7% se declararam não binário.
Quanto à escolaridade, apesar de 61,9% terem nível superior completo ou maior, somente 15,8% têm renda familiar maior do que seis salários mínimos.
Mas entre as informações sobre o empreendedorismo afro no Brasil que mais chama a atenção, estão as voltadas para os segmentos que são explorados por esse grupo.
Conforme o mesmo levantamento, o setor de software e cloud é branco, e somente é citado quando pesquisas deste conceito não fazem recorte de raça. Quando fazem, essa área sequer é citada, sendo as principais:
saúde e estética: 14,3%;
e-commerce: 10,4%;
varejo: 10,4%;
agência de marketing/publicidade: 8,4%;
consultoria e treinamentos: 8,3%;
educação e ensino: 7,3%;
alimentação: 7,0%;
mídia e comunicação: 6,7%;
financiamento, jurídico e serviços relacionados: 5,6%;
eventos: 5,4%
Não deixe de ler este artigo: "ESPECIAL DIVERSIDADE | Mulher Negra: Políticas Públicas, Representatividade e Vivências"
A importância do afroempreendedorismo
De toda a população brasileira, 56% são pessoas que se consideram pretas ou pardas. Dessas, as que se tornaram empreendedoras são responsáveis pela movimentação de R$ 1,73 trilhão por ano.
O conhecimento de causa e o entendimento real das carências desse público fomentam a criação de soluções realmente capazes de supri-las, diferentemente de outras que não foram desenvolvidas com essa base.
Somado a esses fatores, empresas fundadas por pessoas negras são mais propensas a prezar pela diversidade e inclusão, já que esse comportamento faz parte do seu DNA. Por consequência, tem mais chances de sucesso no longo prazo, conforme mostram estudos, como o super conhecido “Diversity Matters”, da McKinsey.
Dica de leitura: "Negritude e impacto: conheça 8 mulheres negras que estão fazendo a diferença na América Latina"
Afroempreendedorismo: 5 cases de sucesso
Com mais de 14 milhões de empreendedores(as) negros(as) no nosso país, quantos já podem ser considerados cases de sucesso?
Algumas das iniciativas nacionais que mais se destacam são:
Conta Black: banco digital que visa democratizar o acesso de pessoas negras a produtos e serviços financeiros, em especial crédito;
Movimento Black Money: hub digital para inserção e autonomia da comunidade negra;
PretaHub: hub de criatividade, inventividade e tendências pretas;
REAFRO: associação sem fins lucrativos criada para fortalecer o empreendedorismo afro por meio da educação empreendedora;
Clube da Preta: clube de assinaturas reúne produtos de mais de 90 afroempreendedores.
4 exemplos de fomento ao empreendedorismo afro
Uma reportagem o site Labs, Latin America Business Stories, destacou que somente 25% das startups brasileiras são lideradas por pessoas negras.
Esse dado vêm do Relatório BlackOut: Mapa das Startups Negras 2021, produzido pela BlackRocks Startups, hub de inovação criado em parceria com a Associação Brasileira de Startups (ABStartups) que promove acesso à população negra ao ecossistema de inovação.
Porém, diversas iniciativas voltadas para o fomento de negócios de tecnologia fundados e/ou liderados por pessoas pretas podem mudar esse cenário.
Um bom exemplo é o Black Founders Fund, iniciativa do Google for Startups que aplica recursos financeiros em startups brasileiras lideradas por negros e/ou negras.
O objetivo desse programa é ampliar a diversidade no ecossistema das empresas de tecnologia, sem participação societária ou qualquer outro tipo de retorno pelo investimento.
Outras iniciativas nacionais que entram na lista de movimentos e ações em favor de startups brasileiras lideradas por empreendedores (as) pretos (as) são:
Semente Preta — Nubank: programa de investimento em startups fundadas por pessoas negras que atuam no meio tecnológico, ou cujas soluções afetam áreas como serviços financeiros, aplicativos, programação, software, marketing digital e serviços de dados;
Diversity Estate: fundo privado de investimento-anjo para startups em estágio inicial lideradas por negros(as) que atuam em setores como blockchain, Open Banking e outros;
Dima Consultoria: por meio do fundo denominado Roots Funding, essa iniciativa visa a captação de recursos de investidores privados e bancos em troca de participações minoritárias em startups fundadas por pessoas pretas. Essas aplicações são direcionadas a fintechs, e também para empresas que criam conteúdos sobre diversidade para serviços de streaming, além das voltadas para saúde e educação.
Os desafios do afroempreendedorismo
Ainda que promissor, e extremamente necessário, o afroempreendedorismo no Brasil tem a sua expansão comprometida por conta de desafios como:
falta de acesso a crédito;
preconceito racial;
desigualdade social.
Falta de acesso a crédito
A dificuldade de acesso a crédito foi o problema apontado por 40% dos entrevistados da pesquisa da RD Station. Nesse cenário, a construção de cooperativas de fomento a esse segmento pode ser uma maneira de resolver essa questão.
Preconceito racial
Em segundo lugar foi citado o preconceito racial, com 30,7% dos apontamentos dos entrevistados. Infelizmente, essa ainda é uma questão bastante enraizada no nosso país, que requer abordagens diversas para que seja suprimida definitivamente. A falta de oportunidades geradas pelo preconceito contribui enormemente para que os negócios de pessoas pretas sejam também afetados, perpassando suas vidas pessoais.
Desigualdade social
A desigualdade social sofrida em grande escala pelas pessoas negras, por questões que mencionamos anteriormente, se perpetua por outras questões como acesso à educação de qualidade, o que tende a comprometer a construção de negócios sustentáveis, com fundadores e fundadoras bem preparados para a desafiadora gestão de uma empresa. Somado a isso, pode comprometer o faturamento da mesma, especialmente se ela estiver localizada em regiões de baixa renda.
Mas como comentamos, o empreendedorismo negro é embasado na necessidade, na vocação e no talento. Considerando esses três pilares, é possível dizer que esse segmento ainda tem muito a crescer, conquistar mais espaço e peso na economia nacional e beneficiar milhares de pessoas.
E como podemos começar? Dando luz a esses empreendedores e empreendedoras, apoiando organizações que trabalham para impulsioná-los, fortalecendo esses negócios por meio da contratação de seus serviços e, claro, colocando a mentalidade de diversidade, equidade e inclusão para caminhar junto à estratégia dos nossos próprios negócios.
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